Ela já era uma
linda mulher quando eu ainda era pirralho e brincava de playmobil. Não me refiro a uma balzaquiana dos dias de hoje, mas
uma gazela que era alguns poucos anos mais velha do que todos nós. Era aquela
deusa grega estigmatizada e almejada por todos os pirralhos das várias gerações
em seus sonhos e vícios solitários. Ela sempre existiu na vida de muitos
marmanjos, aquela menina-mulher que deixou ébrio o mais inocente playmobil, lúdico brinquedo de infância. Aliás, foi de tanto brincar de
playmobil e imaginar em braile essa diva que a turma da infância ficou
conhecida como “A Turma do Playmobil”,
em analogia à mãozinha do brinquedo que já era posicionada ao intento onanista.
Logicamente, o apelido da turma continua até hoje, mas o sentido da mãozinha do
brinquedo é também de tanto segurar um copo de bebida qualquer.
A menina-mulher, em
comento, nunca prestava atenção ou dava ousadia aos pirralhos e muito menos
pensava em se enroscar com um infante que quase era da sua idade. Na verdade, a
menina porcelana dizia preferir homens na acepção adulta da palavra,
excluindo-se, por conseguinte, toda pretensão dos infantes playmobil. Todos os
adjetivos eram poucos para descrevê-la de modo fiel, só restando à memória
corroída pelo juízo da adolescência lembrá-la de uma forma mais abrasiva. A
menina porcelana era linda, cheirosa, elegante, poderosa e extremamente fogosa,
ou seja, era o apetite dos sentidos adolescentes.
Com toda certeza, o homem
que nunca teve uma deusa dessas como mito na infância pode ser considerado como
um homem não vivido. Em consequência de toda essa admiração, quando pensavam em
braile nesta menina-mulher, no recanto sossegado do banheiro, os marmanjos
catavam tranquilamente:
“- Escute essa canção, que é pra tocar no
rádio no rádio do seu coração...” (Moraes Moreira)
Logo em
seguida a mãe enfurecida dizia:
“-Ô Menino, que demora é essa no banheiro? O
que você está fazendo?”
Para apressar
as idas e vindas do pensamento em braile, mudavam o repertório:
“- Pombo correio, voa ligeiro...” (Alceu
Valença)
Em outras
palavras, a menina-mulher era responsável pela inspiração das demoras no
banheiro e pelas demais angústias sofridas da puberdade, principalmente na
criação de espinhas e outros males. A tortura continuava e parecia inacabável,
tendo-se em vista que a nossa diva saía com outros marmanjos mais velhos e nos
jogava em um profundo estado letárgico que era um misto de amadurecimento e
criancice. Aquela deusa parecia intocável, como uma estátua que só se cultua e
não se cutuca, a não ser por um mancebo um pouco mais velho. Era um amor
platônico em todas as suas dimensões.
A vontade de
crescer logo era um desejo uníssono, então, como em uma fórmula mágica de
desejo, olhamos para os lados e começamos a aumentar de tamanho, igualmente com
todas as partes do corpo. Começamos a entender que tamanho também é documento,
mesmo que seja documento de entrada e saída.
Aprendemos a
lidar com a ansiedade e principalmente com as modificações do nosso corpo.
Começamos a sair com outras garotas e vivenciar experiências inéditas, ora, sem
embargos de retórica, aprendemos vivenciar o sexo naturalmente. Tudo normal na
vida de um jovem e como diz o ditado popular: “depois que entra um boi, entra a boiada.”
Esse é um
pensamento estranho quando nos referimos às mulheres que nos brindaram com suor
e o amor na hora da entrega. Com todo esse exercício lascivo em prol da
libertinagem adolescente, passamos a esquecer daquela menina porcelana que em
outros tempos era o desejo de nossas realizações libidinosas, o sonho de
consumo da imaginação infante. Nesse momento de liberdade do nosso amor
platônico, perguntávamos: por onde anda aquela deusa? Será que ainda está
linda?
Inevitavelmente
o sujeito começa a fazer uma digressão para lembrar-se da última vez que viu a
menina-mulher, sendo a última lembrança algo surpreendente. Algumas casam,
engordam e ficam conhecidas como “cururu-de-tanga”.
Outras ficam independentes demais e acabam encruadas, ficando para tia-avó. Há
também aquelas que ficam até famosas e aí o sujeito lembra orgulhoso: “já amei muito essa mulher, mesmo que ela
não saiba!”
Nessa incursão
ao passado, lembrei-me da última vez que vi a minha menina porcelana. Ela
estava desfilando em um conhecido concurso de moda, atraindo olhares muito mais
promissores do que o meu. Logo me veio a lembrança da impossibilidade e a
distância que me separar dela. Sonho impossível! Ela certamente já estaria
alçando passos cada vez mais longínquos. Eu, um pirralho de outrora e o meu
lúdico pensamento. Ora, lúdico é pensar que as nossas meninas porcelanas estão
longe de nosso alcance.
Quem diria!
Encontrei a dita cuja trabalhando em uma farmácia próxima ao local onde eu
trabalho. Ela me reconheceu e contou todo o seu desiderato até aquele momento.
Continuava muito exuberante, pelo menos à primeira vista, mas denunciava um ar
cansado de quem muito dançou o “Samba do
Crioulo Doido”. Cozinhar o juízo dela foi tão fácil quanto perder o juízo
nos hediondos atos onanistas da juventude. O sonho daquele pirralho estava se
realizando de uma maneira muito sossegada, como se fosse um retorno ao velho
banheiro: “Escute essa canção, que pra
tocar no rádio...” (Moraes Moreira).
Essa história
realmente aconteceu com um amigo deste escriba, sujeito este que soube compreender
que seu futuro foi muito mais feliz do que se tivesse realizado uma parte do
passado. Naquele momento refleti as sábias palavras de sábio Vinícius de
Moraes: “a vida é arte do encontro,
embora haja tanto desencontro pela vida.” Ao mesmo tempo lembrei-me das
igualmente sábias palavras do filósofo Pranchú, o ícone de São José da Lagoa
Tapada:
“Ser lúdico na infância é destino, mas
continuar lúdico na maturidade é burrice!”
Assim Falou
Pranchú!
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