A cara já estava esbaforida, os dentes estavam trincados,
a pressão intracraniana parecia que iria estourar o cabeçote, as meias pareciam
extensões das glândulas sudoríparas, as mãos suavam igual ao corno da descrição
de Nelson Rodrigues e a posição era fecal, digo, fetal. Depois desse extenso
apanágio da posição do indivíduo em plena arte defecante pós-moderna, nada do
caboclo descer.
Depois da frustrante tentativa de botar o moreno pra
nadar na privada, o sujeito sai todo engomadinho da casinha privada. Olha meio
desconfiado para um lado, para o outro, mas nada que o abale ante a frustração
do momento de depurar no banheiro da empresa.
Fatigado e contrariado pela merda renegada, o sujeito
volta a trabalhar. Senta-se em sua mesa, coloca uma das mãos e o cotovelo do
outro braço na escrivaninha, inclina-se obliquamente, dá uma ligeira levantada
na perna esquerda e alivia a sua angústia enrustida.
A onomatopeia é acompanhada por uma emanação volátil e
gasosa do corpo, cujo cheiro é peculiar do saturado de anidrido carbônico. Como
se não bastasse o ato vil de usurpar o ambiente de trabalho com essas
emanações, o sujeito ainda pensou em voz alta:
- O peito é o grito de liberdade da merda oprimida!
Todos
olham para ele e, espantado com o potente decibel do seu próprio pensamento, o
sujeito arremata:
-
Desculpem, saiu sem querer!
Não
importava mais, afinal, querendo ou não querendo, a ventosidade já tinha sido
ventilada igual às fétidas palavras. Em que pesem as caras de espanto, o
sujeito estava um pouco tranquilizado, mas nem tanto, afinal havia um urubu
beliscando a sua cueca que insistia em não sair.
Tudo
era questão de psicologia, pois o urubu já era domesticado. Era tão domesticado
que só tendia em sair se fosse no recanto sossegado do seu lar. É verdade, por
mais que aquele sujeito tentasse exorcizar o caboclo no banheiro da empresa, o
urubu só sairia para voar se fosse dentro do seu próprio lar.
O
sujeito procurou médico, pai-de-santo, cu-randeiro e até veterinário, mas nada
do caboclo sair. O sintoma da moléstia que o sujeito era acometido chamava-se
“constipação”, nome arredio para designar a prisão-de-ventre dos tempos da
escravatura, do ventre-livre e do chazinho de boldo.
Várias
explicações eram dadas pelos médicos sobre a tal constipação.
-
Olhe, meu filho, acho que você tem a síndrome da intensidade intestinal, ou
seja, você tem um intestino maior do que o dos outros, por isso você não defeca
todo dia. Já o pai de santo dizia:
-
Mê-za-fí, tu tem o intestino preguiçoso, por isso que não consegue fazer descer
o caboclo!
O
cu-randeiro pregava:
-
O problema é de prega!
Já
o veterinário prescrevia:
-
Não faça força no momento de liberar o urubu, caso contrário ele se retrairá.
Até
mesmo o sogro opinava:
-
Isso é frescura do seu frezado!
Com
tantos prognósticos, só restava o consolo de que a posologia, em geral, era uma
só: purgante de efeito brando em suaves doses, além de cereais e fibras. Caso
ficasse mais de cinco dias sem botar o moreno para nadar, teria que tomar o
purgante em dose cavalar, tendo uma resposta efetiva e imediata.
O
sujeito passou a andar com uma pilulazinha verde no bolso, cujo significado
estava ligado à felicidade do sujeito perante o trono da empresa onde
trabalhava. Era a pílula da escolha pela fuga da Matrix, dando, é claro, uma
passadinha no banheiro da empresa antes.
Com
essas dificuldades que presenciamos diariamente, podemos inferir que todo cagão
é feliz e não sabe. Esse não é um problema endêmico, mas um problema geral que
o povo não comenta por causa da vergonha que geralmente cerca as histórias do
oiti. Era como dizia o velho filósofo Pranchú, nos idos de 1969, em sua
passagem pelo Carnaval de Cabedelo, na Paraíba:
Pegar
mulher feia e cagar todo mundo faz, mas ninguém gosta de comentar.
Assim
falou Pranchú! [1]
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