quarta-feira, 10 de outubro de 2012

DO COMPLEXO DE ÉDIPO COM A MÃE ALHEIA: LIÇÃO DO POLÍTICO



Alguns heróis místicos enfrentavam problemas profundos, por vezes insolúveis. Para os antigos gregos, as suas histórias trágicas demonstravam o quanto a estrutura humana é falível e todas as suas desgraças eram originadas pela sua condição de homens. Talvez um dos mais famosos heróis trágicos seja o tal do Édipo, em cuja história encontrou bem definido um dos mais tormentosos conflitos a que se chamou “Complexo de Édipo”.
            Pulando a parte escatológica e demasiada ficcionista da lenda, o tal do Édipo, nome que significa “pés-inchados”, foi um sujeitinho muito do cafajeste. Imaginem, fugiu da casa dos pais adotivos, matou o pai natural, decifrou o enigma da uma esfinge (monstro com cabeça de mulher e corpo de leão) e, por fim, traçou a mãe, uma rapariga chamada Jocasta. A Rede Globo até fez uma libertinagem televisiva a respeito desse fato grego.
            No final, todos descobriram o acontecido, Jocasta se enforcou e Édipo furou os seus próprios olhos, partindo para o exílio. Esse é, em suma, o Complexo de Édipo. Contar uma lenda grega, além de cultivar os espíritos mais ignorantes, talvez seja uma ilustração para as realidades vivenciais.
            Até o grande psicólogo Sigmund Freud viu nesta lenda o modelo de um conflito fundamental do homem. Negócio de baitola mesmo. Entretanto, muitas das situações vivenciadas hoje em dia são resultados de profunda ignorância, outras, em simultâneo com essa ignorância, são profundas carências afetivas e angustiantes frustrações sentimentais que levam os homens a se agarrarem a antigas lendas para mitigar situações psíquicas, por vezes bem confusas que os atormentam.
            É o caso, por exemplo, do político em vias de votação no Congresso Nacional. Em tempos de emendas, reformas e outras construções, o político se vê às voltas de uma profunda crise existencial, regada a mensalão, jetons, batons e outros tons. Esse angustiante complexo humano cria uma espécie de arquétipo com o sujeito público em fase de votação.
            Parece uma definição abstrata e de difícil compreensão, mas é fácil de ser encontrado no Congresso Nacional. Ora, eles aparecem na televisão, defendem a nação e posam como justiceiros representativos. Mas, em nenhum momento questionam os jetons e mensalões da vida, não têm empatia com a vontade geral da nação e aproveitam o tempo para articulações políticas, afinal, tão logo estarão aposentados. Os políticos, em geral, legislam o que não dói no seu bolso.
            Eis que surge o tal do Édipo na política, em que o político mata os pais adotivos (os eleitores), decifra o enigma da esfinge (vota em projetos de interesse particulares), mas não traça a mãe dele, a messalina chamada Jocasta, afinal, ele não é a besta mitológica d’outrora. Ele fode mesmo é a mãe dos outros.
            O político, então, se resigna ao Complexo de Édipo, mas não sofre por ter lascado a mãe alheia. Ou seja, lamento pelo que votei, mas não pelo que ganhei. Assim é a vida, uns sofrem pelo que tem e outros pelo que não tem. Há, ainda, os que sofrem pelo que têm, pelo que os outros também têm e pelo que os outros não vão ter mais. É o Complexo de Édipo com a mãe alheia.
            A infelicidade do político é indubitavelmente filha da ignorância mesclada com fracasso sentimental e carências profundas. Infelicidade de político é não poder revogar a Lei da Relatividade por intermédio de Lei Ordinária, pois o resto ele pode tudo. Essa conclusão remota as encíclicas pranchunianas referente à mistura da política com a química orgânica:
            “O grau máximo da política e da química orgânica é estruturado pela seguinte fórmula: 2 meteno e 1 bezeno!”

            Assim falou Pranchú!

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

DA VITÓRIA SOBRE SI MESMO


            A cara já estava esbaforida, os dentes estavam trincados, a pressão intracraniana parecia que iria estourar o cabeçote, as meias pareciam extensões das glândulas sudoríparas, as mãos suavam igual ao corno da descrição de Nelson Rodrigues e a posição era fecal, digo, fetal. Depois desse extenso apanágio da posição do indivíduo em plena arte defecante pós-moderna, nada do caboclo descer.
            Depois da frustrante tentativa de botar o moreno pra nadar na privada, o sujeito sai todo engomadinho da casinha privada. Olha meio desconfiado para um lado, para o outro, mas nada que o abale ante a frustração do momento de depurar no banheiro da empresa.
            Fatigado e contrariado pela merda renegada, o sujeito volta a trabalhar. Senta-se em sua mesa, coloca uma das mãos e o cotovelo do outro braço na escrivaninha, inclina-se obliquamente, dá uma ligeira levantada na perna esquerda e alivia a sua angústia enrustida.
            A onomatopeia é acompanhada por uma emanação volátil e gasosa do corpo, cujo cheiro é peculiar do saturado de anidrido carbônico. Como se não bastasse o ato vil de usurpar o ambiente de trabalho com essas emanações, o sujeito ainda pensou em voz alta:
            - O peito é o grito de liberdade da merda oprimida!
            Todos olham para ele e, espantado com o potente decibel do seu próprio pensamento, o sujeito arremata:
            - Desculpem, saiu sem querer!
            Não importava mais, afinal, querendo ou não querendo, a ventosidade já tinha sido ventilada igual às fétidas palavras. Em que pesem as caras de espanto, o sujeito estava um pouco tranquilizado, mas nem tanto, afinal havia um urubu beliscando a sua cueca que insistia em não sair.
            Tudo era questão de psicologia, pois o urubu já era domesticado. Era tão domesticado que só tendia em sair se fosse no recanto sossegado do seu lar. É verdade, por mais que aquele sujeito tentasse exorcizar o caboclo no banheiro da empresa, o urubu só sairia para voar se fosse dentro do seu próprio lar.
            O sujeito procurou médico, pai-de-santo, cu-randeiro e até veterinário, mas nada do caboclo sair. O sintoma da moléstia que o sujeito era acometido chamava-se “constipação”, nome arredio para designar a prisão-de-ventre dos tempos da escravatura, do ventre-livre e do chazinho de boldo.
            Várias explicações eram dadas pelos médicos sobre a tal constipação.
            - Olhe, meu filho, acho que você tem a síndrome da intensidade intestinal, ou seja, você tem um intestino maior do que o dos outros, por isso você não defeca todo dia. Já o pai de santo dizia:
            - Mê-za-fí, tu tem o intestino preguiçoso, por isso que não consegue fazer descer o caboclo!
            O cu-randeiro pregava:
            - O problema é de prega!
            Já o veterinário prescrevia:
            - Não faça força no momento de liberar o urubu, caso contrário ele se retrairá.
            Até mesmo o sogro opinava:
            - Isso é frescura do seu frezado!
            Com tantos prognósticos, só restava o consolo de que a posologia, em geral, era uma só: purgante de efeito brando em suaves doses, além de cereais e fibras. Caso ficasse mais de cinco dias sem botar o moreno para nadar, teria que tomar o purgante em dose cavalar, tendo uma resposta efetiva e imediata.
            O sujeito passou a andar com uma pilulazinha verde no bolso, cujo significado estava ligado à felicidade do sujeito perante o trono da empresa onde trabalhava. Era a pílula da escolha pela fuga da Matrix, dando, é claro, uma passadinha no banheiro da empresa antes.
            Com essas dificuldades que presenciamos diariamente, podemos inferir que todo cagão é feliz e não sabe. Esse não é um problema endêmico, mas um problema geral que o povo não comenta por causa da vergonha que geralmente cerca as histórias do oiti. Era como dizia o velho filósofo Pranchú, nos idos de 1969, em sua passagem pelo Carnaval de Cabedelo, na Paraíba:
            Pegar mulher feia e cagar todo mundo faz, mas ninguém gosta de comentar.
            Assim falou Pranchú! [1]



[1]. Texto originalmente intitulado Constipação S/A (Sozinho e Anônimo).