terça-feira, 22 de janeiro de 2013

OS TRÊS DE SONS DE UM HOMEM



    Desde priscas eras, a onomatopeia sempre foi o substantivo feminino mais utilizado pelo homem, na acepção mais masculina da palavra. Mesmo não sabendo, o homem se utiliza da onomatopeia para sanar suas agruras e suplantar suas aspirações e desejos mais intrínsecos. A onomatopeia, inclusive, foi objeto de profundas reflexões na História do Brasil, sobretudo na ocasião da proclamação da nossa independência.
    De acordo com a historiografia clássica do país, no dia 7 de setembro de 1822, às margens do riacho Ipiranga, o então Príncipe Regente do Brasil, D. Pedro de Alcântara de Bragança (futuro imperador Dom Pedro I do Brasil), teria bradado perante a sua comitiva: “Independência ou Morte!” Pois bem, essa é a parte que todos imaginam que sabem, mas outras estão encrustadas em nosso DNA, embora façamos um tremendo esforço em não conhecê-las. 
    Na referida comitiva de D. Pedro I estava presente uma figura inusitada cujo batismo atende por Francisco Gomes da Silva, também conhecido pela alcunha de “o Chalaça”[1]. Segundo o historiador Assis Cintra[2], esta figura era filho bastardo do Visconde de Vila Nova da Rainha e de uma rapariga de 19 anos, aldeã pobre que trabalhava como serviçal de quarto da família do Visconde. O Chalaça foi ordenado criado honorário do Paço Imperial quando D. João VI e a família real vieram para o Brasil. 
    Segundo consta da historiografia clássica, o Chalaça possuía um caráter “bulhento, extravagante, insolente e dissipado”[3]. De simples criado particular do Paço, foi promovido pelo Imperador (D. João VI) a Ajudante da Guarda de Honra e a seu Secretário privado e, finalmente, tanta ascendência ganhou sobre o ânimo de seu augusto amo, que se pode avançar sem exageração, que partilhava com ele a autoridade suprema. De inteligência absurdamente aguçada, após vários entreveros com a família real, o Chalaça passou a desempenhar a função de oficial-de-gabinete, secretário, escriba, confessor e conselheiro de D. Pedro I, então Príncipe Regente do Brasil. 
    A função institucional que exercia possuía um liame muito delgado com a amizade, motivo pelo qual o Chalaça passou a assumir um cargo bastante inusitado perante D. Pedro I: Assessor para Assuntos Licenciosos (AAL), ou seja, assessor da putaria! O então Conselheiro Gomes, sujeito quarentão e parceiro do jovem D. Pedro I nas incursões aos lupanares da época, era conhecido por sua sagacidade e virtuosidade no trato com as mulheres, subsidiando o então Príncipe Regente no seu trato para com todo tipo de moçoila. A regência do Príncipe pelo Chalaça era meramente voltada à libertinagem e fuleragem mais comezinha. Era a regência da putaria institucionalizada. 
    Os contos históricos mais recentes demonstram que o Chalaça também era bastante perspicaz quando o assunto era dinheiro, aliando-se, na política e na alcova, até mesmo com o capeta para conseguir o que queria. Das memórias posteriores publicadas pelo próprio Conselheiro Gomes, pode-se constatar que o mesmo também era afeiçoado a elogios e puxa-saquismos, eis que esse era um dos motes de seu sucesso. 
    Em sua intrigante caminhada e abnegação junto com o Imperador D. Pedro I, o Chalaça desenvolveu teses e antíteses que um dia seriam objeto de inserção no DNA do homem brasileiro, conforme explicitado acima. O Conselheiro Gomes, baseado na teoria dos três ruídos, inspirada na obra “El hombre y las cosas tríplices”, citado pelo cronista José Roberto Torero, cria um dito filosófico que um dia se transformaria em uma aforismo moral para os machos tupiniquins, baseado em três onomatopeias: 
“Três sons é tudo o que busca o homem no decurso de sua experiência. Não são dois, nunca poderiam ser quatro. Pois tudo bem, e tais são eles: o sussurro das mulheres, o tilintar das moedas e o alarido das palmas. Nenhum homem poderá se considerar plenamente satisfeito - muito embora possa fingir que deles não sente falta, como alguns devotos - se, ao menos uma vez na vida, não tiver tido contado com eles.” [4]
    Trata-se de três verdades axiológicas, metonimicamente formuladas, cuja conclusão foi incorporada na psique do macho brasileiro, sem a possibilidade de qualquer adjetivação ou derivação para o conceito pós-moderno da metrossexualidade (vide O Elo Perdido[5]) ou outra moda mais enviesada. Em outras palavras, não há margem para aplicação para aqueles que têm dúvida de sua própria masculinidade. 
    Os três sons de um homem, muito bem formulado por um sujeito errante, porém gabaritado, remetem aos três objetivos minuciosamente perseguidos pelo macho brasileiro, seja num requintado restaurante com sua donzela ou mesmo em uma micareta, onde ninguém é de ninguém. O que interessa, segundo o Chalaça, é contemplação dos três sons de um homem durante o decurso de sua existência. 
    Assim, nenhum homem estará plenamente realizado se não ouvir os sussurros das mulheres, em seu efetivo plural, durante a sua breve passagem pela terra. Talvez seja esse som (sussurro das mulheres) aquele que se assemelha aos terremotos, maremotos ou tsunamis que fazem com que o homem ande mundo afora atrás de um rabo de saia. Nenhum homem corta o cabelo, faz a barba, põe perfume ou faz outro asseio mais simples se não for em virtude de uma bela gazela. Para o Conselheiro Gomes, a chavasca se constitui como a mola que move o mundo, juntamente com o sussurro que a acompanha. 
    Da mesma forma, segundo o Chalaça, não há como ser um homem plenamente satisfeito sem a onomatopeia advinda dos “tilintares das moedas”. Trata-se, como bem conota a referida metáfora, da satisfação advinda do sucesso ou êxito financeiro alcançado pelo macho, afinal, não há como figurar de playboy sem ter como pagar. Há quem diga que essa onomatopeia (tilintares das moedas) seja provocada justamente para suplantar o primeiro som de um homem (sussurro das mulheres), eis que cortejar uma dama, seja em restaurante ou bordel, necessita de recursos financeiros. 
    O último som de um homem, para o Chalaça, seria o “alarido das palmas”, que representa justamente o reconhecimento ou elogios que são agraciados ao homem. Essa onomatopeia (alarido das palmas) representa a exaltação dos adjetivos e das virtudes do homem, sendo a contemplação de algo que diferencia os homens. Há quem diga que essa onomatopeia também seja para contemplar o primeiro som de um homem (sussurro das mulheres), pois nenhum homem é virtuoso em algo apenas para regozijar-se. Assim, por exemplo, resta claro que um homem vai para academia malhar não por causa da sua saúde, mas sim por conta da visibilidade que granjeia com a mulherada. A conclusão é simples: a malhação objetiva a chavasca! 
    Cada povo reza a antropologia mais óbvia e rasteira de sua respectiva herança cultural. Com o povo brasileiro não foi diferente. Assim como uma doutrina que compõe um sistema filosófico, o qual incorpora conhecimento aos homens no decorrer dos anos, a teoria dos três sons, criada pelo Conselheiro Gomes, está encrustada no ácido desoxirribonucleico do homem brasileiro, estigmatizado em várias circunstâncias, negócios, fatos, acontecimentos, condições ou estado das coisas. 
    O futebol, por exemplo, é considerado uma paixão nacional justamente porque é a mais lídima expressão da busca perfeita pelos três sons de um homem: o sussurro das mulheres, o tilintar das moedas e o alarido das palmas. Quem nunca sonhou em ser um jogador de futebol na infância ou na juventude para escutar repetidamente os três sons acima! É justamente aí que a teoria diferencia aqueles que são macho de fato, pois, segundo consta a lenda, dificilmente encontra-se um qualira que goste de futebol. 
    Outro exemplo é a cerveja. O gosto pela cerveja é uma busca pelos três sons de um homem, mesmo que seja uma busca efêmera. O sujeito que vai ao bar, bebe cerveja e fica ébrio, mesmo sem brio, certamente ficará açoitado por uma sensação arrebatadora dos três sons de um homem, afinal, todo bêbado fica rico, bonito e joiado! O sujeito começa a falar alto, achar que toda mulher está dando mole e paga tudo pela cerveja, inclusive para os amigos. 
    Não menos elucidativo, outro exemplo bastante comum pode ser constatado nos negócios. Aquele que obtém sucesso nos negócios objetiva igualmente a busca perfeita pelos três sons de um homem, desde que seja homem, evidentemente. No Brasil, inclusive, existe um mantra muito curioso em torno dos bem sucedidos empresários: quando ficam milionários, gostam de aparecer! Nem que seja na revista Caras ou Bundas! Ainda em relação a esses bem sucedidos empresários, é possível constatar a famosa troca da mulher de sessenta pela balzaquiana, como uma forma de upgrade de mulher. Nesse caso, é comum ver o milionário vovô-garoto de mãos dadas com a neta, digo, com a nova esposa. 
    Pois bem, a teoria dos três sons, materializada por um sujeito rústico, bruto e sistemático, como se diz lá no Goiás, faz parte da epiderme do homem-macho brasileiro, sendo objeto de uma herança transpassada por gerações e que se renova a cada dia, além de uma fórmula para manter-se perene às novas investidas da moda, assim como a metrossexualidade e outras vaidades típicas do sexo feminino. A teoria dos três sons de um homem tem evidente fundamento axiológico nos pergaminhos pranchurianos quando do discernimento da mulher, afinal, diria Pranchú, as mulheres amam os homens que apresentam qualidades inversas aos seus defeitos. 
    O homem que nunca buscou os três sons, assim como explicitado pelo Chalaça, certamente é um sujeito marcado pela própria natureza e que possivelmente se resguarda das coisas boas da vida. É como se o homem não se descobrisse, afinal, como diria o mestre Pranchú na invasão de São José da Lagoa Tapada pelos Fenícios: 
“Para o sujeito que é um mau fodedor, até o saco atrapalha!”
Assim Falou Pranchú! 


[1]. É aí que entra para a história o Sr. Francisco Gomes da Silva, que tinha o apelido de Chalaça, que significa dito de zombaria, dito picante, frase graciosa e satírica. (FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1995).
[2]. CINTRA, Assis. O Chalaça favorito do Império. Disponível em: <virtualbooks.com.br/freebook/
port/did/chalaça/chalaça.htm>. 2000. Acesso em: 22 maio 2011. p. 08.
[3]. ARMITAGE, João. História do Brasil. São Paulo: Melhoramentos, 1977, p. 111.
[4]. TORERO, José Roberto.  Galantes memórias e admiráveis aventuras do virtuoso conselheiro Gomes, O chalaça. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p. 92.


quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

DO FUMO À FODA: ENSAIO SOBRE A CAVERNA

[1]


[1]. Título originário: “Ensaio sobre Pranchú, segundo Platão.”  




            - Puta que pariu, Prancha! Que porra de lugar é esse? Se eu não fosse seu amigo há muitos anos, certamente diria que você é um tremendo de um baitola!
            - Pô, Plata, mas não foi você mesmo que disse que queria ir a um local propício para refletir sobre metafísica, gnoseologia, dialética e misticismo? Então, aqui é um excelente local para isso!
            - E tinha que ser na porra de uma caverna escura como essa? Não poderia ser na encosta de uma montanha, em uma enseada, em um barco ou em qualquer outro local mais arejado? Francamente, esse local é totalmente desconexo do mundo e não tem nada a ver com o que penso. Perdi o meu tempo. Bem que eu poderia estar batendo uma bolinha com velho Sócrates lá no CT do Clube Ateniense e tomando uma Dionísia[1] estupidamente gelada!
            - Calma, Plata, não fique bravo. Não é você mesmo que diz: “tudo que ilude, encanta!”[2] Pois bem, esse local ilude e, por isso mesmo, encanta. Já fiz várias reflexões por aqui com o colega Zoroastro, oportunidade em que discutíamos sobre a crença no paraíso, na ressureição, no juízo final e na vida de um messias, esses papos mais amenos.
            - Papos mais amenos? Você acha que discutir o juízo final é um papo ameno?
            - Tudo depende de como as coisas são contadas, amigo Plata. Estamos aqui para “buscar a verdade essencial das coisas”[3].
            - E como você acha que vou buscar a verdade essencial das coisas nesse breu e sem inspiração alguma?
            - Cara, fica tranquilo que já pensei em tudo. Para chegar a essa verdade, eu trouxe um rango que não é bem um “banquete”, mas vai ajudar, afinal, saco vazio não para em pé. E também, trouxe outro negocinho aqui!
            - Que outro negocinho, Prancha?
            - Bem, já que a Lei das XII Tábuas (Lex Duodecim Tabularum ou Duodecim Tabulae, em latim) ainda não regulamentou a matéria como contravenção, trouxe um cigarrinho do capeta para vaporizar o ambiente e ajudar na inspiração. Assim, podemos ficar inspirados e sem aquele laricão!
            - Só você, hein, Prancha, para me tirar do sério!
            Instintivamente, Pranchú saca do farnel um tufo de planta canabácea[4], um delgado xantungue de seda e, com uma desenvoltura de um mestre Jedi, envolve tudo com apenas uma das mãos, transformando-se em um gigantesco charuto de cannabis! Com a outra mão, Pranchú pôs fogo em umas gramíneas utilizando-se da vetusta técnica fire starter[5]. Em seguida, o famigerado cigarro já estava aceso e em plena utilização.
            Após trinta minutos de um silêncio catatumbal, o diálogo recomeça com um clima mais aprazível!
            - Aê, Prancha, acho que você tinha toda razão! Esse cenário é perfeito para uma reflexão profunda. Sou capaz de discutir até mesmo sobre o juízo final e outros enfoques mais tranquilos. O ambiente me tranquiliza para pensar, afinal: “quando a mente está pensando, está falando consigo mesma.”[6] Olha só aqueles lindos pássaros fazendo uma harmoniosa revoada!
            - Ô Plata, acho que você não está enxergando direito, pois aquilo ali não é um bando de pássaros, mas um bando de morcegos. Não tem nada de bonito naquilo.
            - E daí, o que importa é o conceito!
            - Que conceito? Morcego é morcego e pronto! Esse escuro todo também não contribui para essa sua visão turva.
            - Prancha, “podemos facilmente perdoar uma criança que tem medo do escuro. A real tragédia da vida é quando os homens têm medo da luz.”[7]
            - Agora fudeu de vez! Você não está falando nada com nada.
            - Imagine esses lindos passarinhos...
            - Passarinhos o caralho, são morcegos, Plata!
            - Que seja! Imagine esses morcegos, que vivem em uma caverna escura, descobrindo o mundo de luz que tem lá fora. É como se libertassem de uma prisão interna e descobrissem a verdadeira essência das coisas para além do mundo sensível. É como se pudessem acreditar, desde que nasceram, que o mundo é de determinado modo e, então, descobrem que quase tudo aquilo é falso, parcial e que existem novos conceitos, totalmente diferentes.
            - Bicho, não sei que porra é essa que você está falando, mas pode ser que tenha algum sentido.
            - É como se os morcegos se libertassem de sua própria ignorância! Os morcegos que aqui gorjeiam não gorjeiam como lá!
            - Caralho, o fi de rapariga está doidão! Plata, toma um pouco de água que você passou para o estágio de perturbado emocionalmente.
            - Prancha, os morcegos se libertam da ignorância. “A alma deseja voar de volta para casa, para o mundo das ideias. Ela que se libertar do cárcere do corpo” [8]
            - Vixe Maria!
            -“Não há nada bom nem mau a não ser estas duas coisas: a sabedoria que é um bem e a ignorância que é um mal.” [9]
            - Pronto, agora está poetizando a parada!
            - “Todo homem é poeta quando está apaixonado!” [10]
            -  É o que, Plata?
            - “Não há ninguém, mesmo sem cultura, que não se torne poeta quando o amor toma conta dele.”
            - Ok, Plata, essa conversa está tomando um rumo muito estranho. Estamos no meio de uma caverna bem escura e você vem com esse papinho de amor, apaixonado, coisa e tal! Que viadagem é essa?
            - “A parte que ignoramos é muito maior que tudo quanto sabemos.”
            - Ignorância é o caralho! A única coisa que sei é que essa maconha está revelando o seu lado baitola! Pare de falar merda e tente volver em si.
            -“Tente mover o mundo. O primeiro passo será mover a si mesmo.” [11]
            - Foda-se! Agora dê o primeiro passo para mover a si mesmo e vamos para casa. Você já passou dos limites, seu maconheiro safado!
            Duas semanas após esse desconexo diálogo, Prancha e Plata se encontram em frente ao Liceu Ateniense, escola onde a turma da época estudava. Um pouco envergonhado, Plata enceta:
            - Amigo Prancha, peço escusas por aquele dia! Fiquei demasiado entorpecido e não me lembro de muita coisa. A única coisa que me lembro é que cheguei em casa e anotei no caderno algumas coisas sobre caverna, descobertas, luz, escuridão, sei lá, algo do gênero. No outro dia, quando fui ler, não entendi porra nenhuma. O caderno está lá, embaixo da minha escrivaninha e com um cheiro insuportável de maconha.
            - Tudo bem, acho que a marijuana subiu muito rápido para essa sua mente já ensandecida. Mas me diga uma coisa, e aquele papinho de amor, apaixonado, coisa e tal? Fiquei preocupado. Estás virando qualira[12]?
            - Não, amigo Prancha! Na verdade, estou totalmente arreado por uma bela e jovem gazela que mora nos arredores de minha humilde morada. Trata-se de uma vizinha cuja graça atende por Diotima de Mantinea[13]. Ela é tão especial que só tenho vontade de cultuá-la e não de tocá-la de forma alguma!
            - Você chegou pelo menos a conversar com ela?
            - Não, amigo Prancha, pois a única coisa que tenho desejo é de cultuá-la espiritualmente, pois a vida dela me ensina a genealogia do amor. Deve ser por essa razão que fiquei falando algumas coisas desconexas na caverna. A razão é simples: estou sofrendo por causa desse amor!
            - Plata, de filósofo à punheteiro, você é um bom sujeito. Em todo caso, existe posologia para o seu problema.
            Da narrativa acima, o filósofo e matemático Platão extraiu profundos conhecimentos acerca da filosofia pranchuriana e que daria ensejo a duas de suas principais obras e filosofias: A Alegoria da Caverna[14] e o Amor Platônico[15]. Da maconha na caverna ao mundo da filosofia, Platão redeu-se aos ensinamentos de Pranchú, embora, naquele instante de sua vida, ainda estivesse açoitado por um amor impossível por sua própria natureza. Nesse instante, Pranchú revela a posologia para a cura do amor não correspondido:
            - Para curar um amor platônico, só mesmo uma trepada homérica!

            Assim Falou Pranchú!


[1]. Cerveja oriunda de Dionísio, deus grego equivalente ao deus romano Baco, dos ciclos vitais, das festas, do vinho, da insânia, e, sobretudo, da intoxicação que funde o bebedor com a deidade.
[2]. Frase platônica.
[3]. A busca da verdade essencial das coisas é um dos objetivos principais da filosofia de Platão.
[4]. Cannabis sativa = maconha!
[5]. Acendimento de fogo por meio da fricção de uma pedra sob uma superfície áspera (outra pedra, piso ou madeira dura).
[6]. Frase platônica.
[7]. Frase platônica.
[8]. Frase platônica.
[9]. Frase platônica.
[10]. Frase platônica.
[11]. Frase platônica.
[12]. Qualira = perôba = baitola = viado = homossexual.
[13]. Diotima de Mantinea é uma filósofa e sacerdotisa grega com um papel importante no Banquete de Platão. A filosofia de Diotima está na origem do conceito platônico de amor. A única fonte sobre ela é o próprio Platão e por isso não é possível assegurar se era uma personagem ou alguém que de fato tenha existido. Entretanto, praticamente todos os personagens dos diálogos platônicos correspoderam a pessoas que viviam na antiga Atenas.
[14]. A “Alegoria da Caverna” foi um mito sucessivamente interpretado por Platão, simbolizando a metafísica, a gnoseologia, a dialética, a ética e a mística platônica. Em sua totalidade, é o mito que expressa Platão de forma abrangente, deixando muitos paralelos com os dias atuais.  REALE, Giovanni & ANTISERI, Dario. História da Filosofia: Antiguidade e Idade Média. Vol. I, São Paulo: Edições Paulinas, 1990,  pág. 168.
[15]. Amor platônico, na acepção vulgar, é toda a relação afetuosa ou idealizada em que se abstrai o elemento sexual, como num caso de amizade pura, entre duas pessoas. Esta definição, contudo, difere da concepção mesma do amor ideal de Platão, o filósofo grego da Antiguidade, que concebera o Amor como algo essencialmente puro e desprovido de paixões, ao passo que estas são essencialmente cegas, materiais, efêmeras e falsas. O Amor, no ideal platônico, não se fundamenta num interesse (mesmo o sexual), mas na virtude. Fonte: Wikipédia (http://pt.wikipedia.org/wiki/Amor_plat%C3%B4nico)

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

O CHAMADO





    O chamado à labuta é imperdoável! Desde a revolução industrial que o capitalismo pegou o trabalhador pela goela e disse: “Acabou a boquinha!” Fomos enxotados do espaço bucólico rumo às quitinetes de quarenta metros quadrados onde antes apenas cabiam as vassouras de uma casa. E desde as indústrias a vapor, estamos mais e mais escravos de uma sociedade opressora onde o ócio criativo não passa de um argumento para vender livros, uma balela. Trabalha-se de 8 as 8 nos dias normais, sem hora extra. Esta é a rotina que aprisiona os trabalhadores e emburrece os terráqueos. 

    Pois bem, eis que em uma sexta-feira, não sei se 13, mas certamente uma sexta-feira, dois trabalhadores chegaram em casa. Apenas uma casa, pois seus lares estavam a quilômetros e quilômetros de distância. Aquela casa era apenas um agrupamento de trabalhadores que se uniam para prover o sustento aos seus. A sexta-feira é a conclusão de uma semana árdua de trabalho, onde o descanso não apenas se faz necessário quando corpo e mente exaustos reclamam: “ai ai ai meu cu! Tira, tira que tá doendo”. Os dois então se prostraram à televisão para consumir bobagens televisivas, deixando a televisão exercer seu papel de máquina de lavagem cerebral. Doravante daremos nomes aos bois para que os leitores ilustrem a dor e a vergonha dos personagens: Benício e Getúlio. O refúgio dos trabalhadores ainda conta com um terceiro personagem que atenderá pela alcunha de Saraiva. 

    Saraiva chegou em casa e viu seus iguais inertes, boquiabertos e salivando, tamanha a exaustão. A revolta lhe consumiu a alma, pois estava imbuído de forças para abrir as asas e varrer os recantos noturnos da cidade. Tal como Biaffra, queria “voar, voar ... subir, subir”. Chegou em casa com sangue nos olhos para fazer o culto à Baco e angariava parceiros para a empreitada. Parafraseou Padre Zezinho ao cantar: 
    
    Se ouvires a voz do Saraiva chamando pra biritar, a decisão é sua.” 

    Ao escutar o chamado Benício e Getúlio de pronto recusaram. Entretanto, a insistência de Saraiva, tal como o canto de uma sereia no cio, seduziu os mancebos, os quais se arrumaram para “dar uma voltinha pela night”.

    Saraiva os conduziu ao inferninho mais próximo e chegando lá lhes ofereceu o manjar etílico que mudaria o rumo dos eventos: uma long neck de Heineken para cada um. Sorveram o líquido com a vontade de um beduíno que atravessou desertos à procura de uma garrafa de Baré Cola. Neste momento viram o caminho, a verdade e a luz! Lembraram de um antigo poema hindu cuja penúltima estrofe diz: 

    “Se não for pra dar show num saia nem de casa!” 

    Entraram no inferninho com a força de uma horda de mongóis liderada por Gengis Khan. Destroçariam todas as virgens, ou melhor dizendo, descabaçariam todas as virgens caso virgens encontrassem. O balcão do bar era o altar do sacrifício onde várias e várias long necks foram “desta pra melhor”. Bebiam como se fosse o leite materno que jorrava dos seios de suas mães. Até aí tudo bem, pois como podemos lembrar frases do inconsciente coletivo: 

    “Eu bebo sim, estou vivendo. Tem gente que não bebe e tá se fudendo!” 

    O álcool acompanha a humanidade desde que andávamos curvos na saudosa era mesozoica. Entretanto, é sabido que este mesmo álcool é nosso amigo até a terceira garrafa. Daí em diante a levada se dá como cantam as crianças castrati no Vaticano antes do desjejum: 

    “Beba por sua conta e risco, pois cu de bebado aleatorius est!” 

    Foi neste ponto que a caça se virou contra o caçador. Benício simulava gestos obscenos com uma garrafa de cerveja ejaculando cevada nos convivas ao redor. Getúlio rolava pelo chão só pra ver com que cor ficaria a camisa branca. Seu Saraiva, ao ver a balbúrdia que seus amigos faziam no recinto, tentou organizar a putaria. Da lama ao caos e do caos à lama, onde os bêbados já chafurdavam e faziam do chão do bar sua morada .... Saraiva fez bico e demonstrou arrependimento, pois bêbado ruim é que nem farinha: “quando dá o vento, num tem quem ajunte”.

    O ponto alto foi quando Getúlio se indignou ao ver em sua conta uma Fanta ... O mancebo havia bebido centenas de cervejas e apareceu uma Fanta em sua conta. Ninguém segurou Getúlio: todos pra fora. Saraiva sentou-se no meio fio e escutou pelo resto da noite um mantra pranchuriano o entoado repetidamente por Benício e Getúlio: 

    Agora chame os amigos pra beber, chame !” 

Assim Falou Pranchú!